Por Daniel Endebo (twitter: @danisendebo)
Clima de festa pelos 450 anos do Rio de Janeiro, última partida oficial de Leo Moura como jogador do Flamengo, estreia da nova – lindíssima! – camisa 3 do Mais Querido, Maraca recebendo o melhor público do ano, rival enfraquecido. Estava escrito, em letras garrafais, pra quem quisesse ler: vai dar merda.
A construção da narrativa vitoriosa rubro-negra é, via de regra, indissociável da adversidade. A história recente, principalmente, prova que quando a torcida tá muito confiante e a atmosfera é favorável, a chance de insucesso é potencializada. Mas tendo um freguês pela frente, como pensar diferente?
A bola começou a rolar e o Mengaço parecia disposto a reconstruir a historinha. A molambada bem-vestida sairia feliz da vida, Leo Moura encerraria seu ciclo no clube com uma vitória e os comandados de Luxemburgo dormiriam na liderança do Carioqueta. E o primeiro tempo realmente alimentava essa esperança.
Com Marcelo aberto pela direita, Gabriel pela esquerda e Alecsandro enfiado, o Fla dominava amplamente as ações do jogo. Em certo momento, chegou a ter quase 65% de posse de bola. Jonas, estreante como titular, vinha bem nos desarmes, e o rubro-negro sobrava em campo. Faltava ao Flamengo duas coisas básicas: chutar a gol e comportar-se como Flamengo. Muitos jogadores desse elenco parecem não ter a menor dimensão do que representa trajar o Manto Sagrado.
A coisa começou a degringolar ainda na primeira etapa, quando Samir deixou o campo com uma lesão muscular. Deu lugar a Bressan, que faria uma partida daquelas pra nunca lembrarmos. Samir, aliás, precisa se benzer – ou se cuidar mais. Sofre com problemas musculares com uma frequência incomum para um garoto de 19 anos. Ou tá metendo muito o pé na jaca ou realmente sofre com uma questão que foge ao olhar de um leigo em medicina esportiva.
Luxemburgo vestiu a sua fantasia de professor pardal e cagou tudo de vez na segunda etapa. Tirou Gabriel, que fazia uma partida discreta e colocou Arthur Maia. O problema não é mudança em si, mas o que ela ocasionou; com Maia em campo, Luxa redistribuiu suas peças no tapete verde de um modo que jogador algum entendeu.
Márcio Araújo foi pra direita, onde sumiu; Canteros foi recuado e errou quase tudo que tentou; Cirino foi para a esquerda, onde, sem apoio algum, foi presa fácil. E ainda teve Arthur Maia, que individualmente conseguiu ser pior que Gabriel. O Botafogo ganhou campo, cresceu no jogo e criou diversas boas oportunidades; o Flamengo, por sua vez, ficava num marasmo daqueles, chuveirando a bola a torto e a direito – foram 36 cruzamentos rubro-negros na partida, todos sem perigo.
O golpe de misericórdia veio minutos depois: Vanderlei Luxemburgo sacou Alecsandro e colocou Eduardo da Silva.
Bem na primeira etapa, mal na segunda. (Foto: Site Oficial)De fato, o camisa 9 não vinha bem também, mas, uma vez mais, ele “inventou” no posicionamento: Marcelo na referência e Eduardo, o mais lento dos atacantes do nosso plantel, aberto pela esquerda. Foi um convite ao Botafogo. Duas bolas no travessão foram o prenúncio da derrota anunciada. O destempero de Bressan, os chiliques de Wallace e a bunda molência do time, personificada no seu capitão, viraram derrota no gol-trapalhão de Tomás. Um chute de média distância, que ninguém se importou em cortar, estourou na trave, sacaneou o arqueiro flamengo e morreu nas redes.
Não foi a primeira (e nem será a última) vez que o Flamengo perdeu para o Botafogo. Tampouco foi a única vez que a camisa que vence jogo sozinha foi trajada por atletas que não sabem o que ela significa. O resultado, portanto, foi o mais óbvio possível. Climão de festa somado a um monte de cagadas, só poderia dar nisso.
Não é o fim do mundo, mas requer uma reflexão: Luxemburgo está utilizando esse início de ano para desenvolver ideias, testar jogadores e observar a fundo seu elenco – o que é louvável. Mas nada disso tem valor se o time for incapaz de performar em bom nível. Os atletas precisam assimilar não só o plano de jogo, mas, principalmente, a responsabilidade que têm enquanto jogadores do Flamengo. Já é a terceira atuação discreta da equipe, que poderia liderar com folga o Carioca e estar classificado para a próxima fase da Copa do Brasil. O comandante, que extraiu o máximo de um time que carregava cimento no ano passado, precisa ter mais pés no chão e ser menos profexô pardal.