Uma sensação de desconforto tomou conta do jornalista e pesquisador Hélcio Herbert Neto nos últimos tempos. A sensação de que o Flamengo estava cada vez mais associado a forças políticas de extrema direita. Foi essa sensação que o motivou a lançar o livro “Conte Comigo: Flamengo e Democracia”, pela editoria Ludopédio, com prefácio do músico Moacyr Luz.
A obra traz depoimentos de dez ilustres rubro-negros sobre a relação do clube, sua torcida e sua significação cultural com a luta pela democracia no Brasil. Falaram Luyara Franco, filha da vereadora Marielle Franco; Afonsinho; Fabiana Beltrame; Jayme de Almeida; Hildegard Angel, irmã do remador Stuart Angel; Nando Antunes Coimbra, irmão de Zico; BNegão, do Planet Hemp; Elza Soares; Jards Macalé; e Ynaiã Benthroldo, do Boogarins.
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Ao jornal O Globo, Helcio falou: “O projeto começou com um desconforto de ver o Flamengo associado a extrema direita. Como pesquisador, eu sabia que essa ligação direta era reducionista. O Flamengo é muito grande e sua história tem episódios de autoritarismo. Mas as manifestações democráticas, transgressoras e até subversivas são expressivas.”
Em um dos depoimentos mais fortes, Elza Soares, pouco antes de falecer em 20 de janeiro deste ano, contou sobre como políticos se aproximam e usam o clube para ganhar popularidade. “Qualquer um que quer popularidade vai se aproximar do clube e de toda essa torcida maravilhosa. Era assim no passado, ainda é assim hoje em dia.”
Luyara Franco, filha da vereadora Marielle Franco, também deu um depoimento emocionante. Sua mãe, assassinada brutalmente no Rio de Janeiro em 14 de março de 2018, era flamenguista doente. Figura comum na arquibancada do Maracanã. Aliás, foi em um estádio que Luyara testou os limites da democracia.
Ela conta: “O que mais mexeu comigo, inclusive pouquíssimos meses após aquele 14 de março, foi um caso de fascismo. Não me deixaram ficar com a bandeira da minha mãe. Estava escrito apenas “Marielle Presente” e tive que entrar com aquilo escondido. Foi uma situação bem delicada. Depois disso fiz uma camisa do Flamengo com a mesma mensagem.”
Irmão do maior ídolo do Flamengo foi perseguido pela ditadura
Fernando Antunes Coimbra, irmão mais velho de Zico, foi professor do Plano Nacional de Alfabetização, programa que usava os métodos do Folósofo e Educador Paulo Freire para ensinar crianças e adultos a ler e escrever. Com o golpe militar de 1964, o PNA foi considerado subversivo e seus participantes monitorados e até mesmo perseguidos.
“Em 1970, eu e meus primos ficamos quatro dias presos na Polícia do Exército. O Antunes, o Edu e a minha mãe foram à porta da PE e disseram que só sairiam de lá comigo. O Edu foi cortado da seleção porque era nosso irmão. João Saldanha disse que havia restrições à família Antunes.”