O Flamengo escolheu o aniversário de 35 anos do seu maior título para inaugurar um velho sonho em termos de infraestrutura: o módulo profissional do Ninho do Urubu. A conquista do Mundial nem tinha completado três anos, porém, quando o então presidente George Helal deu o pontapé inicial para a construção do centro de treinamento que oficialmente leva o seu nome: em 30 de agosto de 1984, o Flamengo comprou por 300 milhões de cruzeiros o terreno em Vargem Grande, de propriedade do aviário Soaves. Como tantas histórias do Flamengo, essa também começa com Zico: o dinheiro para a operação veio da venda do maior ídolo do clube para a Udinese, no ano anterior.
– Não queria gastar o dinheiro do Zico com jogador. Na época, me chamaram de visionário. Ele foi adquirido para a base. A ideia era ter 200 garotos entre nove e 18 anos ali, jogando e estudando para sair como atleta e homem – disse Helal em 2014 ao Globoesporte.com, em uma reportagem sobre os 30 anos do ainda incompleto Ninho.
Desde 1984, dez pessoas passaram pela cadeira de Helal. O Ninho ficou muito tempo abandonado e chegou a ser incluído como moeda de troca em uma negociação que deu certo. Amanhã, finalmente sairá do papel. O MRN repassa os principais acontecimentos desde a compra do terreno até a inauguração de amanhã, que enfim colocará o Flamengo em pé de igualdade com os principais clubes do país (leia matéria sobre o assunto publicada na semana passada).
ANOS DE ESQUECIMENTO
Na primeira década em posse do Flamengo, o Ninho ficou praticamente esquecido. O único avanço significativo aconteceu na gestão do presidente Gilberto Cardoso Filho, em 1990, com o aterramento do terreno, que era cortado por dois rios.
– Quando chovia, inundava tudo. Fiz uma obra lá que durou um ano e meio, e todo o terreno foi aterrado. Deixei quatro campos prontos, só faltando botar a grama, dois inclusives, já tinha drenagem. Isso foi em 1990 e a grama só foi posta mais de dez anos depois, em 2004.
O intervalo se explica: primeiro veio a gestão de Luiz Augusto Velloso (1993-1994), que deixou o Ninho de lado para se dedicar a outras prioridades em matéria de infra-estrutura, como a finalização da sede da Gávea e a ampliação do estádio Bastos Padilha, que por um período chegou a receber jogos para até 15 mil pessoas com arquibancadas tubulares.
Em 1997, em vez de investir em um terreno que pertencia ao clube, o então presidente Kléber Leite fechou o contrato de aluguel de um outro centro de treinamento, que ficou conhecido como Fla-Barra.
– Não poderíamos sair e ir para o Ninho, onde não havia nada e estava quase descampado. O Flamengo tinha que dar continuidade a sua vida. Houve procura enorme de soluções e tivemos a sorte de ir para o Fla-Barra – disse Kléber Leite ao GE em 2014.
Na gestão seguinte, de Edmundo Santos Silva, porém, o Flamengo foi despejado do Fla-Barra, por falta de pagamento. Incentivado pelo acordo com a ISL, o então presidente chegou a apresentar um projeto faraônico para o Ninho, com dez campos, ginásio poliesportivo, piscina, área de recuperação médica e fisioterapia. Mas a ISL faliu, Edmundo sofreu impeachment e o Ninho continuou abandonado.
Com o terreno prestes a completar 20 anos de aquisição e sem nenhum uso, o sucessor de Edmundo, Hélio Ferraz, tentou se desfazer do Ninho.
– A solução factível na época foi a tentativa de uma troca com o CFZ. Chegamos a sentar com o diretor-geral do CFZ e fizemos uma proposta de permuta. Daríamos o Ninho do Urubu e o imóvel de São Conrado, e eles nos entregariam as instalações do CFZ – disse Ferraz ao Globoesporte.
Foi aí que Zico apareceu mais uma vez na história:
– Quase fechamos, mas o Zico não quis. Acho que ele até fez bem, mas para nós era uma solução.
ENFIM, OS CAMPOS
Mais de vinte anos após a aquisição do terreno, numa nova gestão de Márcio Braga, o Flamengo enfim decidiu começar a tirar o projeto do Centro de Treinamento do papel. O então vice-presidente de Finanças e Administração José Carlos Dias criou a campanha “Eu Amo o Fla” para arrecadar fundos para a construção do CT. A data de entrega dos dois primeiros campos, prontos para receber treinamentos, foi marcada para o aniversário de 109 anos do clube, em 15 de novembro de 2004. Só que na véspera o Flamengo sofreu uma das suas piores derrotas na história do Campeonato Brasileiro, uma impiedosa goleada de 6×1 para o Atlético-MG. O time ficou serissimamente ameaçado de rebaixamento – só escaparia na última rodada – e jogadores brigaram com torcedores no aeroporto. Natural que o lançamento nessas circunstâncias fosse visto apenas como um factoide para desviar a atenção, ainda mais porque não havia qualquer estrutura além dos campos.
Quase dois anos depois, nas vésperas da final da Copa do Brasil, o treinador Ney Franco surpreendeu ao levar o time para um treino secreto no Ninho – que sequer tinha estrutura de vestiário para os jogadores. Se foi decisiva ou não, o fato é que a estratégia deu certo e o Flamengo enfim conquistou o bi da Copa do Brasil após três vices nas três finais anteriores, com o Ninho ficando com uma marca de sorte. A essa altura do campeonato, a base já havia transferido seus trabalhos para o agora renomeado CT George Helal, embora em uma estrutura precária.
EMPURRÃOZINHO DE LUXA
Foi apenas quatro anos depois, em 2010, já na gestão de Patricia Amorim que o Flamengo se transferiu definitivamente pro Ninho. Sem qualquer tipo de planejamento, mas apenas por decisão abrupta de um homem: o técnico Vanderlei Luxemburgo, contratado em sua terceira passagem para o Flamengo como bombeiro para salvar o time da incômoda situação de brigar contra o rebaixamento um ano após ter sido campeão brasileiro. Na chegada, Luxemburgo decretou: a partir daquele dia, os treinos na Gávea eram passado.
– A Gávea acabou para o Flamengo. Só treinaremos lá por absoluta necessidade.
Por sugestão de Luxa, o Flamengo investiu na estrutura provisória de contêineres que durou até este ano. A partir de então, o clube voltou a priorizar a finalização do CT. Patricia Amorim lançou a campanha dos tijolinhos, na qual torcedores doavam R$ 250 para a construção do Ninho. O bom trabalho à frente da pasta de Patrimônio fez Alexandre Wrobel ser o único vice-presidente da gestão Patricia mantido com Eduardo Bandeira de Mello. Mas nos primeiros anos da nova gestão, o Ninho esteve em segundo plano diante do pagamento de dívidas e do time de futebol. As obras chegaram a ficar paralisadas por mais de um ano.
Uma cena impressionante no entanto conscientizou todos os rubro-negros da importância de enfim concluir o CT – o goleiro Paulo Victor sofreu uma grave lesão durante um treinamento e teve que ser rebocado em um carrinho de mão, pois os carrinhos-maca não podiam circular no piso enlameado em volta do gramado em um dia chuvoso. Na campanha eleitoral do ano passado, todos os candidatos colocaram a conclusão do CT como uma de suas prioridades. O dinheiro veio de patrocínio da Ambev e da economia com a redução dos pagamentos mensais de dívidas com o governo pela adesão ao Profut.
Assim, 32 anos, 3 meses e 14 dias depois, o terreno comprado pelo presidente George Helal enfim vai se transformar num centro de treinamento que faz jus ao nome. Mas a saga ainda não acabou. O projeto inicial do presidente, de abrigar a base, continua pendente. Por enquanto, os jovens irão aproveitar a estrutura provisória que foi usada ao longo deste ano pelo profissional. A partir de abril do ano que vem, as obras do módulo definitivo da base devem enfim começar. A expectativa é que estejam concluídas até o fim de 2018 – antes da compra do terreno completar os mesmos 35 anos que o Mundial faz amanhã.
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