Dome busca uma equipe versátil para um esquema dinâmico. Não quer apenas 11 grandes titulares, e busca maximizar tudo o que o elenco tem
Blog Flamengo em Foco | Marcelo Portella – Twitter: @mcportella
Ao derrotar o Santos ontem na Vila Belmiro por 1 a 0, o Flamengo conseguiu apenas a sua terceira vitória na história do Campeonato Brasileiro contra este adversário no mítico estádio da Baixada Santista. Os feitos somente foram alcançados pelo Fla campeão de 2009 com Adriano Imperador e o Fla de 2011, no histórico 4 a 5 liderado por Ronaldinho Gaúcho.
Após 20 dias de trabalho, com cinco jogos em 15 dias, parte da torcida já estava irritada com o novo treinador Domènec Torrent. Com cinco pontos em 15 disputados e atuações abaixo da crítica, já havia quem pedisse a cabeça do treinador catalão.
Sendo assim, com a primeira semana livre de trabalho depois de já ter estreado, criou-se uma expectativa quanto a evolução da equipe neste jogo contra o Santos. Alguns já esperavam um Flamengo avassalador, como se em uma semana de trabalho fosse possível transformar um time que vinha capengando, conseguindo empates graças a pênaltis na bacia das almas. Parecia óbvio que não seria assim.
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O Flamengo encarou um adversário que teve postura bem diferente dos cinco desafiantes anteriores. O Santos entrou com uma postura agressiva, buscando partir pra cima do Flamengo desde os primeiros minutos. O esquema com pontas abertos, Bruno Henrique na esquerda e Michael na direita, com dois volantes mais móveis e técnicos e com Arrascaeta bem próximo de Gabigol no comando de ataquem parecia ser interessante contra esse tipo de jogo. E logo no início da partida, com toques de primeira de Thiago Maia e Arrascaeta, Gabigol recebeu em ótima condição de marcar. O artilheiro parou na defesa do goleiro Santista e no rebote Michael com o gol praticamente vazio chutou para fora.
Mas o Santos não mudou sua forma de jogar e continuou atacando incessantemente, abusando da habilidade e velocidade de seus dois pontas Marinho e Soteldo. Vieram então os dois gols anulados. Gols bem anulados, porém, milimetricamente ilegais, o que, claro, evidenciava problemas no setor defensivo rubro-negro. Tivessem os jogadores milimetricamente em posição legal fatalmente os gols teriam sido convertidos da mesma forma, e esse é um ponto que deve ser levado em consideração.
Pois bem, se os gols anulados por milímetros abalaram o Santos, do lado rubro-negro não foi muito diferente. Com dois gols sofridos invalidados pela consulta ao vídeo, parecia claro aos jogadores que o jogo estava bem difícil. O Flamengo buscou jogar com mais inteligência, tentando sair na boa. E neste cenário, mais um contra-ataque sensacional foi construído, iniciado por Gabigol, conduzido por Bruno Henrique que serviu Michael, que mais uma vez desperdiçou a chance, desta vez parando no goleiro João Paulo.
Diego Alves, por sua vez, fazia boas defesas, mas não por conta de chances cristalinas do Santos. O Santos chegava mais na base do abafa, da pressão enquanto as jogadas do Flamengo pareciam construídas de forma mais fria, bem ensaiada, faltando somente o acerto final. E ele veio ainda no final do primeiro com ótimo contra-ataque puxado por Gabigol. Em jogada executada pelo lado direito em parceria com Michael, o artilheiro fez seu terceiro gol neste Brasileiro, mas o primeiro com bola rolando.
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Veio o segundo tempo e com exceção de um chutaço de Raniel excelentemente defendido por Diego Alves e um chute de Sanchez para fora logo após a contusão que resultou na saída do arqueiro rubro-negro, o Santos praticamente não ameaçou o Flamengo. Já o time rubro-negro abusou de perder chances, com destaque para Gabigol que perdeu duas chances inacreditáveis. Todas elas em jogadas muito bem construídas, com a bola passando de pé em pé.
Está aí a grande evolução que eu vi neste Flamengo. Praticamente todas as grandes chances criadas pelo Flamengo (e não foram poucas) resultaram de ótimas trocas de passes, velocidade, deslocamento dos jogadores. E em muitas delas o finalizador recebeu com grande liberdade para concluir a gol. Embora com bom volume de chances em alguns dos cinco jogos anteriores, não havíamos visto ainda tamanha fartura e liberdade para finalizar como vimos ontem.
A evolução também foi notada na condição física dos jogadores. O time jogou com mais intensidade por mais tempo na partida de ontem se comparado com os jogos anteriores. Destaque para Gabigol que, em que pese os gols perdidos, se movimentou como há muito não víamos.
Também foi um jogo interessante para desmistificar alguns pré-conceitos que a torcida rubro-negra já tinha sobre o treinador. Ontem Michael, que não entrava há quatro jogos, foi escalado e jogou os 90 minutos. E jogou muito bem. Pedro e Vitinho, que vinham entrando sempre, ontem não participaram. Mesmo com boatos de atrito com o treinador, Arrascaeta jogou durante os 90 minutos. Se contra o Atlético-MG, perdendo o jogo por 1 a 0, Dome terminou cinco atacantes em campo, ontem terminou o jogo sem jogadores de área de ofício – algo de certa forma incomum aqui no Brasil – e que gera naturais questionamentos.
Dome mostrou em seis jogos que dificilmente teremos um time titular fixo. Alguns jogadores nós sabemos que raramente sairão, mas o treinador já deu todos os indícios de que busca uma equipe versátil, com variações: um esquema dinâmico. Ele não quer apenas 11 grandes titulares, e busca maximizar tudo o que o elenco tem a lhe oferecer. É uma forma mais comum na Europa, mas que ainda sofrerá resistência no Brasil, com o torcedor mais acostumado ao jeito pragmático de jogar e organizar uma equipe. Só o tempo dirá se vai dar certo. Mas o fato é: houve evolução.