A temporada 2015 do futebol do Flamengo foi um fracasso. Esse fato piora quando lembramos que este foi o ano com, digamos assim, menor arrocho de verba, da administração EBM, embora o choque de gestão e austeridade financeira tenham permanecido. Destaque para um ponto relevante: o aumento da despesa no futebol só pôde ser empregado no segundo semestre do ano, o que de certa forma impactou a montagem do time. O clube ainda lida com novos esqueletos que aparecem nos armários da Gávea. Como em um filme de terror, apavorando o fechamento das contas.
O importante é que dirigentes e torcida entendam que o caminho da transição de um passado de administração amadora, sem princípios básicos de governança empresarial, não é feito em um estalar de dedos. Três ou quatro anos não são suficientes para uma guinada de direção tão grande — sem pequenos e grandes erros –, no maior clube do Brasil e sua gama infinda de complexidades. E o Flamengo não é um ente independente. Existe lá fora um cenário completamente desfavorável para se fazer o certo por ser puramente o certo a se fazer.
Aqui cabe explicar que uma estrutura administrativa moderna em nada depõe contra o ideário de um clube social e multi-esportivo como o Flamengo. O termo governança empresarial não pode ser traduzido como perda de identidade sociocultural e sim como mecanismo de melhor gestão do dinheiro que entra, percorre o clube, e sai como atividade fim gerando outro ciclo econômico.
Nenhuma catástrofe aconteceu no triênio rubro-negro. Fomos avisados de que seria um período de muita luta, contra diversas frentes de batalha. O próximo triênio vai herdar, além da esperança de títulos no gramado, um clube com parques esportivos reformados, um décimo das pendências jurídicas de 2012, e a consolidação de um modelo de governança estruturado através da rede de diretores-executivos, com metas estipuladas pelos seus vice-presidentes, amadores na acepção literal do termo.
Nenhum clube brasileiro teve tal coragem de passar pelo tratamento ostensivo ao qual o Mengo se propõe. A ampla maioria opta por gestões temerárias, inconsequentes ou fantasiosas. Muitas vezes amparadas em conluios políticos, são amigos dos amigos, um elo na corrente putrefata, contudo ainda forte do Futebol 7 a 1.
Um grande título no futebol geralmente afasta do campo de visão da massa manipulada — a catarse eufórica e míope da conquista! — toda a gama de erros de gestões… temerárias, inconsequentes ou fantasiosas.
Nos últimos dias estamos vendo isso acontecer com o Sport Club Corinthians Paulista.
Doente, o clube não teve a vitalidade necessária para permanecer na Série A do Campeonato Brasileiro. Caiu em 2007, logo após a eleição de Andrés Sanchez pra comandar o atual segundo time com mais torcida do Brasil. Figura nova na cartolagem brasileira, hoje deputado federal eleito pelo Partido dos Trabalhadores.
O incensado título brasileiro recém-conquistado pelo Corinthians pode maquiar muita coisa errada no clube paulistano. Perfeito dentro de campo, com ótimo trabalho da Comissão Técnica de Tite, é bom que se deixe isso claro aqui.
Mas o torcedor do Corinthians pode exibir troféu, estádio, bom time, bom marketing, ótima representatividade na imprensa, força nos bastidores e meandros da política em várias esferas governamentais com orgulho? Os que não se importam com os meios que o clube encontrou para obter essas conquistas podem.
E os que se importam, como o jornalista Juca Kfouri? Em coluna na Folha, o renomado corintiano lamenta com indignação a relação mutualista entre seu time de coração e os podres poderes que governam o país e o futebol. Leia.
“O país de Eduardo Cunha, de Delcídio do Amaral, de Eduardo Cunha não cansa de chocar.
O país de Ricardo Teixeira, José Maria Marin, de Andrés Sanchez não dá trégua.
O país, em silêncio, vê Marco Polo Del Nero renunciar seu cargo na Fifa e indicar Fernando Sarney para seu lugar.
Como Sanchez se faz de seu desafeto, embora o tenha estimulado a não renunciar na CBF, indica um Sarney para substituí-lo.
(…)
Se Cunha resiste com desfaçatez desmedida, se Amaral está preso como Marin, se o julgamento de Azeredo demora mais que o tempo em que o Corinthians de Sanchez ficou sem ser campeão paulista nos anos 1950/60/70, Nero imita Cunha e abusa da falta de vergonha, nem aí para o prejuízo que causas à imagem do futebol pentacampeão mundial, humilhado pelo 7 a 1 que a gestão Marin e dele proporcionou.
E torcedor algum bate panela para exigir que Cunha e Nero vão embora, que Azeredo seja julgado e, pior, ainda aplaude Sanchez como se fosse ele, e não Tite e seus jogadores, os responsáveis pelo hexacampeonato brasileiro.
Atribuem a Sanchez o estádio erguido pela Odebrecht graças à intermediação de Lula que, nada republicano, foi o melhor presidente corintiano.”
Para os torcedores do Flamengo que não apoiam os atos pertinentes do presidente Eduardo Bandeira de Mello contra o sistema atual do futebol brasileiro: o rompimento com a FERJ; a carta magma de reivindicações que nosso mandatário entregou à CBF esta semana; a não participação no Circo de Horrores encapada de eleição da CBF; e o beija-mão ao Coronel Nunes — eu os convido a entrarem de cabeça no futebol fora das quatro linhas.
A discussão sobre Márcios Araújos e Paulinhos da vida é realmente válida. Mas não esqueçam vocês da frase atribuída a Hermes Trismegisto: “O que está embaixo é como o que está em cima e o que está em cima é como o que está embaixo, para realizar os milagres de uma única coisa”.
10 problemas sérios da gestão corintiana em 2015
São indicadores de dificuldades, decisões e métodos que exemplarmente contribuem para a estrutura falida do futebol brasileiro.
1) O Corinthians sofreu o ano inteiro com salários atrasados. Interlocutores do Parque São Jorge dizem que quem segurou o grupo foi o Gerente de Futebol Edu Gaspar e o próprio Técnico Tite. A dificuldade do clube para honrar seu compromisso com os jogadores não começou nesta temporada. Mesmo assim a farra de contratações continuou e a Libertadores deste ano foi pretexto para que não houvesse uma debandada. Não adiantou em nada, com um grupo insatisfeito em campo a eliminação veio de forma humilhante para o pequeno Club Guaraní, do Paraguai. Engraçado saber que este ano a CBF criou até regulamento para punir time com perda de três pontos no Brasileiro por conta de salário atrasado. Só pra inglês ver.
2) Agora o mito precisa ser desconstruído e fica fácil quando o time que ele escolheu está em má fase e ele próprio, vive um inferno astral. Estou falando de Paolo Guerrero. Embora a mídia corintiana esteja sorrindo de orelha a orelha com os quatro gols, oito amarelos e um vermelho do seu ex-artilheiro, a máscara de felicidade só serve para esconder que o clube perdeu um ídolo. Que expediente pequeno ver dirigentes diminuindo a importância do peruano para a parca história internacional do clube. O gol de cabeça decisivo contra o Chelsea hoje é quase um crime. Dois erros em um do futebol 7 a 1: Diminuir importância dos ídolos, cuspir na história. E inversão de valores, visto que a diretoria corintiana quis de toda forma segurar Guerrero. Com proposta vantajosa do Flamengo na mesa não conseguiu dar suas garantias e pagar as luvas que o jogador pediu, e merecia. [Se alguém chama o jogador de mercenário por causa dessa exigência, não quer que o futebol brasileiro avance na meritocracia. Neymar cumpre metas no Barça e terá salário reajustado como prêmio e garantia contra possíveis propostas de “Mengões” europeus. Mas aqui na Terra Brasilis Guerrero está errado?]. A Imprensa bairrista pouco reverbera os salários e luvas atrasados que o Corinthians tinha com o jogador também. Ópera do resumo: Bizarra tentativa de desconstrução da imagem do Guerrero. Graças a Deus Zico amamos nossos ídolos, vide Adriano que foi para os lados de lá e mesmo assim mora nos nossos corações até hoje e sempre vai morar.
3) Depois de conseguir um estádio em Itaquera ao custo de 1,4Bi, segundo dados da Revista Exame do mês de maio de 2014, o Corinthians pagará R$ 1,170 bilhão pelo estádio, sendo R$ 400 milhões do BNDES, R$ 420 milhões dos Certificados de Incentivo ao Desenvolvimento (CIDs) e R$ 350 milhões do empréstimo recente. O que o clube ainda não sabe é como e onde vai conseguir dinheiro para bancar o custo dos empréstimos (R$ 750, entre BNDES e Caixa). Pelo cronograma de pagamento, serão R$ 59,3 milhões no primeiro ano (2015), R$ 101,3 milhões entre 2016 e 2027, e R$ 84,4 milhões em 2028, totalizando R$ 1,4 bilhão. Tudo saindo da conta do clube. Em nota oficial o clube negou estes dados, dizendo que o custo total ficou em R$ 985 milhões.
4) A Caixa Econômica Federal, além de patrocinadora máster é agente financeira do financiamento do Corinthians na construção da Arena Corinthians. Os 400 milhões do BNDS são recursos com origem no Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e no Fundo de Participação PIS/Pasep, ambos trabalhistas. Enfatizando: R$ 400 milhões que foram empregados em cimento, vaso sanitário de ouro e mármore de carrara no estádio alvinegro saíram de um fundo governamental trabalhista.
5) O jornalista Rodrigo Capelo (@rodrigocapelo, da Revista Época), em coluna publicada no dia 14 de novembro, mostra que o filho caçula de Lula recebeu cerca de 400 mil reais do Corinthians desde 2010. Luiz Cláudio Lula da Silva tinha diversas funções, segundo o ex-presidente Andrés Sanchez (sempre ele!). Era olheiro, preparador físico e seus tentáculos se estendiam até em negociações de parcerias comerciais. Na carteira de trabalho do Filhote de Lula constava que ele era auxiliar de escritório. Cabide de emprego é prática comum da cartolagem em clubes e federações. Como disse Kfouri, esse país não para de chocar. No Flamengo as práticas de seleção dos recursos humanos estão cada vez mais definidas. No #DesafioDasChapas, o MRN abordou esse tema. Não deixe de conferir como a Chapa Azul, vencedora da eleição, pretende ampliar a ética nas contratações do clube nos próximos anos (o MRN vai cobrar, claro). Inclusive, queremos que todos os funcionários do clube estejam listados no site com suas respectivas atribuições. E isso não precisa demorar pra ser feito. Fica a exigência aqui para os novos dirigentes.
6) Falta de transparência às vezes se mistura com malandragem barata no Corinthians. O clube não soma no valor total da sua dívida o que deve para o pagamento da Arena Corinthians. Embora utilize o estádio para indicação de riqueza. Tudo para não constar nas listas de clubes mais endividados do mundo. Coisa que o Corinthians é, mesmo com toda a mordomia e berço esplêndido oferecido pelo poder público ao clube.
7) O Corinthians passou este ano pagando 400 mil reais para Alexandre Pato atuar no rival São Paulo. Antes cometeu a loucura de pagar 15 milhões de euros ao Milan pelo jogador. Mico histórico que denota a megalomania que tomou conta dos seus dirigentes após o título mundial. Pato volta do empréstimo e o clube terá que arcar com seu salário total de 800 mil reais e a enorme rejeição da torcida.
8) O clube ainda não conseguiu fechar um contrato de naming rights de seu estádio. Pronto desde o primeiro semestre do ano passado. Claro que sempre surgem diversas empresas interessadas, e ao mesmo tempo! Fato é que o clube ainda não conseguiu fechar nada. A Caixa (agente financeira do financiamento) prevê repasse de 100% desta verba publicitária para o pagamento da dívida. Enquanto a dívida existir o clube não verá a cor do dinheiro. As últimas informações falam de uma empresa de Varejo e outra de Petróleo interessadas. As ofertas seriam em torno de 300 milhões de reais, cerca de um terço do custo de construção do estádio declarado pela gestora Arena Corinthians.
9) O dinheiro da cota de TV de 2015 foi antecipado pela gestão anterior, para pagar contas em meio ao perrengue. Prática comum em clubes com dificuldades financeiras. O Flamengo não adiantou nenhuma cota de televisão. Recebeu o valor contratado para 2015 em 2015. Lembrando que, ao antecipar as receitas o clube paga juros sobre, a única que ganha com isso é a rede de TV que realiza essa antecipação, pois fecha um contrato por um valor e paga efetivamente um valor menor.
10) Enquanto o Flamengo, com sua política austera, toma o remédio amargo que cura o convalescido, o Corinthians campeão brasileiro vai se acorrentando em dívidas com ex-funcionários, jogadores, empresários de jogadores, empresas e até sócios do clube. Durante o ano pipocou notícia de dívida. Com o técnico Mano Menezes, 4 milhões de reais. À GP Sports, empresa que administra a carreira do volante Ralf, 3 milhões por conta de pedidos de empréstimos. O empresário Carlos Leite foi outro que emprestou dinheiro ao clube, 2 milhões. A situação esteve tão braba no Parque São Jorge que o conselheiro do clube Fernando Garcia emprestou 6,5 milhões de reais. Tite também cobrou 3,5 milhões referentes à sua última passagem. O Corinthians hoje vive um caos administrativo/financeiro e em nenhum momento pensa em baixar sua bola e anunciar corte nos investimentos. Será que a farra vai continuar em 2016?
Bônus: O Corinthians apoiou o Coronel Nunes. O novo presidente da CBF. Altamente capacitado para ser a marionete paulista.
Conclusão
O Corinthians não apoia a Primeira Liga. Não apoia uma união de clubes. Eles querem fazer parte desse Brasil que não dá certo desde a chegada de Cabral. Eu tenho certeza que os grandes corintianos do Brasil, que querem fazer esse país soberano, generoso e rico sentem vergonha da política externa do seu clube. Hexa no campo, partidário do 7 a 1 fora dele. Por mais que dentro de campo o time de Tite, Elias, Jadson e Renato Augusto tenha seu brilho, esse campeonato é mais um que marca a história decadente do futebol brasileiro. O Corinthians, assim como outros clubes brasileiros, estão no cerne da imoralidade desta máquina de fazer merda e nos apresentar merdões como alguns dos personagens citados ao longo do texto. Teixeira, Del Nero e Marin são subprodutos dessa imundície. No campo fomos patéticos com nossos jogadores mal treinados e sem alma rubro-negra. Na moral estamos atropelando adversários. Ou esse bandão toma tendência ou o que os restará serão as manobras bem à feição daquele personagem, o Dick Vigarista.
Diogo Almeida é um ex-beatnick boleiro. Escreve no Cultura RN quando consegue colocar as ideias no lugar. Siga-o no Twitter: @DidaZico.
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