A janela de transferências chegou e, ao contrário da expectativa criada no final do ano passado, as contratações do Flamengo estão acontecendo lentamente. Mesmo que ocorram, provavelmente serão menos do que esperávamos, com um lateral-direito praticamente descartado, por exemplo.
Muita conversa circula sobre isso, alguns acusam a diretoria de querer beneficiar amigos e empresários próximos, mas a verdade é muito pior. O dinheiro acabou. Sim, é isso mesmo que você ouviu.
A célebre frase que entrou pro lore do Clube de Regatas do Flamengo pela voz do ex-presidente Márcio Braga volta a ser verdadeira. Embora de forma muito menos dramática que daquela vez, acabou o dinheiro. Mas como pode ter acabado o dinheiro de um clube que fatura um bilhão por ano?
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O faturamento de R$ 1 bilhão
A primeira coisa que precisamos esclarecer é que faturamento não significa caixa. Não sou nenhum Rodrigo Capello, mas esse conceito é básico. O faturamento refere-se a tudo que o Flamengo ganha, mas boa parte disso já tem uma destinação. Grande parte é usada para suportar custos operacionais, como folha de pagamento, hospedagens e viagens.
Além disso, boa parte do faturamento vem da bilheteria, a qual é prejudicada por custos do estádio e pagamento a entidades que não contribuem em nada. Também temos valores destinados a técnicos incompetentes contratados por salários altíssimos e multas ainda maiores.
Desse faturamento do Flamengo, parte é destinada para a compra de jogadores. E esse valor nunca chega perto da metade de R$ 1 bilhão. Nem tem como ser.
Vi recentemente um tweet que dizia: “Pergunta dos rivais: de onde vem o dinheiro do Flamengo. Pergunta dos flamenguistas: Para onde vai o dinheiro do Flamengo?”. O divertido tweet tinha um tom meio conspiratório, como se o Flamengo estivesse sendo roubado. Não é isso que estou insinuando, afinal, além de não ser prudente acusar coisas assim sem provas, eu realmente não acredito nisso.
Para onde vai o dinheiro do faturamento do Flamengo?
Mas para onde vai o dinheiro do Flamengo? Por que chegamos a essa altura do campeonato amarrados nas contratações? Simples. Contratações mal feitas. Peguemos um lápis para analisar.
De 2022 para cá, o Flamengo fez as contratações de Cebolinha, Ayrton Lucas, Gerson, Luiz Araújo e Allan (além de Rossi sem pagamento de multa). Todos esses vieram e estão no elenco hoje, mas foram pagos de forma parcelada. Para fazer as contas, usarei os números informados pela imprensa.
Contratamos Cebolinha por – segundo o GE- 16 milhões de euros. Desse valor, 1,5 será pago apenas ao final de 2025, se o jogador não for vendido. Ainda segundo o site, esses valores foram parcelados para serem pagos até o final deste ano. Se fizermos uma conta de padeiro, levando em consideração que normalmente as parcelas têm vencimento a cada 6 meses, esse ano Cebolinha nos custará 6,4 milhões de euros.
Mas continuemos. Gerson nos custou 16 milhões de euros no total, mas com a compensação o montante pago foi de 8,5 milhões de euros. Aqui nós temos uma escolha a fazer, contamos apenas com o desembolso que fizemos ou contamos com a não entrada da receita que estava prevista. Não há informação na imprensa de quantas parcelas foram, mas vou presumir o mesmo que Cebolinha, 5. No primeiro caso, Gerson nos custará esse ano 3,4 milhões de euros. No segundo 6,4 milhões de euros.
Ayrton Lucas custou 7 milhões de euros no início de 2023. Também segundo o GE, pagaremos esse valor até o fim de 2025, o que significa que isso nos custará esse ano pelo menos 2,32 milhões de euros (se em cinco parcelas) ou 2,8 milhões de euros (se em seis parcelas).
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Dinheiro rasgado
Mas não paramos por aí. Ano passado adquirimos os direitos do ponta-direita Luis Araújo. A transação custou 9 milhões de euros e transformou o jogador vindo de MLS na 9ª contratação mais cara da história do país. Na época, segundo o site Transfermarket, o atleta tinha valor de mercado de 6 milhões de euros.
Presumo mais uma vez que o Flamengo pagará em cinco parcelas -por falta de notícia disso na imprensa- o jogador nos custará esse ano 3,8 milhões de euros. Me parece ainda mais mal pago quando falamos do histórico de transações do jogador que saiu do Brasil para França por 10,5 milhões e depois da França para os EUA por 11,5 milhões. Estando o jogador cinco anos mais velho do que na primeira transação.
E aqui chegamos ao que – para mim – é o maior desperdício de dinheiro do Flamengo até hoje. Allan, que chegou e pouco jogou, custará aos cofres do Flamengo, de 8,2 milhões de euros. O que se noticiou é que desse valor, 40% seria pago à vista, portanto 3,28. Já os outros 60% o Rubro-Negro pagará esse ano em duas parcelas. Logo, pagaremos por Allan 4,92 milhões de euros.
Para onde foi o dinheiro
Em síntese, se tem que esse ano nós pagaremos 23,84 milhões de euros de contratações passadas. Sabe quanto é o valor orçado para ser usado em transferências esse ano? 30 milhões de euros. Acontece que desses 23,84 milhões -e aqui entra uma opinião pessoal – a esmagadora maioria foi dinheiro jogado fora.
Cebolinha nunca valeu o que custou, Ayrton eu tenho minhas dúvidas, mas é possível (embora estejamos nos amarrando para pagar dez no Viña). Já os casos de Luis Araújo e Allan são escandalosos. Enquanto Braz pagou 50% acima do valor de mercado de Luis Araújo, contratamos Allan com uma LESÃO CRÔNICA, além de ter se lesionado várias vezes desde que chegou aqui.
O devaneio De La Cruz
Marcos Braz já deu algumas entrevistas rebatendo a “acusação” de que o Flamengo não olha para o mercado sul-americano e com isso perde joias do continente para clubes menores da Europa. Em entrevista ao Charla Podcast, o dirigente falou:
Você vai à Argentina, tem 15% por obrigatoriedade para o jogador. 10% para o sindicato, se não pagar, esquece. O jogador é mais barato? É, mas você entra em um risco. É um jogador que ainda não demonstrou… ou que ainda não jogou uma liga tão forte como os que você teoricamente está buscando na Europa. Não temos nenhum problema com nenhum jogador da América Latina, apenas uma situação de mercado
Marcos Braz no Charla PodCast
Já no PodFla, além de reafirmar o acima exposto, Braz também disse:
Porque eles (times sul-americanos), vendem? Pelo mesmo problema que a gente. Precisam fazer caixa, precisam pagar contas. Então eles querem sempre pagamentos à vista. Porque o custo financeiro para eles, ainda mais na Argentina, é maior que para gente. Então se você faz uma aquisição de 3, 4, 5 milhões de dólares, você paga 3, 4, 5 mais 25% e tem que à vista.
Marcos Braz, no PodFla
Eu entendo e concordei com a afirmação do dirigente à época. Mas o que mudou de lá para cá? Por que então nos propusemos a pagar 14,66 milhões de euros à vista em um único jogador? Reparem que isso significa quase metade do valor destinado a contratações no ano. Se devemos acrescentar os tais 25% a mais, que Braz alega ter que pagar na Argentina, soma-se ainda 3,66 milhões de euros ao valor.
Reparem que ainda que tenhamos um orçamento carcomido por contratações ruins de anos anteriores, seria possível a contratação dos jogadores nos moldes normais do Flamengo no mercado. Entretanto, Braz abandonou seu próprio discurso em prol de uma demagógica contratação para mostrar serviço após o ano desastroso que ele nos proporcionou.
Acabou o dinheiro
Hoje nos restam 11,68 milhões de euros para resolver as carências do elenco. Isso explica a dificuldade em fazer qualquer contratação porque qualquer centavo é muito valioso. O dinheiro acabou, mas não por que não temos ou por que não arrecadamos. Muito menos por que gastamos mais do que podemos. O dinheiro acabou porque foi mal gasto. O dinheiro acabou porque Marcos Braz e Rodolfo Landim só sabem contratar o óbvio.
Tudo isso se torna mais engraçado quando eu lembro de recente áudio vazado de Landim. Nele, o presidente do Flamengo afirmava que não queria ver alguém chegar a destruir tudo que ele dedicou 6 anos para construir no Flamengo. Mas a verdade é que Landim nos últimos anos tomou todas as escolhas erradas e com elas dificulta que montemos bons times.
Enquanto isso se fala em “reconstrução”. Boa sorte ao reconstruírem o segundo melhor elenco da história do Flamengo. Boa sorte ao fazer isso com quem fez essas barbeiragens no mercado de transferências.
Renato Veltri é advogado, formado pela UFRJ em 2019 e flamenguista formado por sua irmã, Vanessa, na final da Copa do Brasil de 2006. Twitter: @veltri_renato.
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